Armadilhas atuariais da compensação previdenciária

Armadilhas atuariais da compensação previdenciária

Os sistemas públicos de previdência do funcionalismo, também conhecidos como Regimes Próprios de Previdência Social dos Servidores Públicos – RPPS, conforme estipulado pelo artigo 40 da CF/88, definem-se como um seguro social de adesão compulsória e caráter contributivo, visando formar uma reserva financeira que seja suficiente para arcar, ao longo do tempo, com os benefícios previdenciários acordados.

O pressuposto constitucional, na sua interpretação majoritária, é que cada ente federativo, no legítimo exercício da sua autonomia, pode ou não regulamentar o acesso a tal direito para seus respectivos servidores. O curso normal dos acontecimentos pressupõe que até a instituição do RPPS, no âmbito municipal/estadual, a totalidade dos servidores públicos estatutários estavam vinculados ao Regime Geral de Previdência Social – RGPS, vertendo ordinariamente, mês a mês, contribuições para este regime previdenciário, atualmente administrado pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS. A criação de cada RPPS, no âmbito do respectivo ente federado, faz cessar o vínculo dos servidores públicos estatutários com o RGPS, passando tais a contribuir ordinariamente para os cofres da entidade de previdência municipal/estadual criada especificamente com o propósito de administrar a concessão de benefícios previdenciários, a aplicação dos recursos acumulados com as contribuições supracitadas nos mercados financeiros etc.

Os direitos previdenciários de cada servidor estatutário, na forma das contribuições vertidas, passam a estar parte no RGPS, parte no RPPS e, consequentemente, caberá ao RGPS ressarcir ao RPPS tais contribuições em algum momento no futuro. Eis onde nasce o problema! O estudo atuarial inicial, quando da instituição de muitos RPPS, supôs que as contribuições vertidas por cada servidor estatutário, acrescidas das respectivas contribuições patronais, quando restituídas aos RPPS seriam devidamente corrigidas pela inflação e capitalizadas pela taxa de juro, período a período. O Congresso Nacional, todavia e infelizmente, ao legislar tardiamente sobre a matéria o fez em detrimento dos demais entes federados, beneficiando unilateralmente a União, ao definir uma regra de compensação financeira entre o RPGS e os demais RPPS observando-se, tão somente, a proporcionalidade do tempo de contribuição em cada regime previdenciário.

Distinção importante é que o valor do dinheiro no tempo é medido pela taxa de juro, porque as pessoas (e as instituições!) possuem preferencias temporais centradas no presente, quer dizer, ninguém em sã consciência abriria mão de R$ 100,00, na data presente, para receber igual quantia daqui a 10 anos, mesmo que reajustada pela inflação do período. Suponha, apenas a título de ilustração, enfatizando o fim pedagógico desta exposição, que o servidor estatutário verteu contribuições para o RGPS durante a primeira metade da sua vida laboral, migrando em seguida para o RPPS, vertendo ao mesmo a segunda metade das suas contribuições, aquelas mais próximas da sua aposentadoria e, justamente por isto, tendo menos exposição aos juros (rendimentos!) de mercado.  Fica evidente, neste exemplo, vide Figura 01 abaixo, que a regra fundada tão somente sobre a “proporcionalidade ao tempo de contribuição” prejudica de forma significativa os cofres do RPPS, sobrecarregando indevidamente o Tesouro Estadual/Municipal pela inflação injusta dos respectivos déficits atuariais, posto que a compensação financeira deveria custear 61,69% dos benefícios e não apenas 50%, um verdadeiro disparate!

Figura 01

Formação da reserva do servidor estatuário, na data de aposentadoria, em função da forma de ponderação das contribuições ao longo do tempo.

A compensação financeira entre os regimes previdenciários deve, antes de tudo, ser justa, porque tais recursos geralmente constituem uma parcela significativa da reserva técnica dos segurados de cada RPPS, que é o fundamento de longo prazo da garantia de pagamento dos benefícios. Entendemos que a legislação vigente, referente à compensação previdenciária, prejudica seriamente a solvência dos planos de benefícios previdenciários, portanto a discussão sobre sua reestruturação é fundamental para viabilidade orçamentária e econômica, não somente dos respectivos planos, mas inclusive dos entes federativos!

Os anos dourados de capitalização pulsante estão chegando ao fim, principalmente devido ao crescimento exponencial dos benefícios concedidos e ao infeliz e sistemático atraso das contribuições previdenciárias, portanto urge a necessidade de discutir cada aspecto da gestão de risco destes sistemas de previdência. A reforma iniciada com a EC nº 103/19 não deve ser entendida como um porto de chegada, mas antes como um porto de partida!

Thiago Soares Marques, Atuário MIBA nº 1.507

Túlio Pinheiro Carvalho, Atuário MIBA n° 1.626

Marketing Arima

2 Comentários

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    Marketing Arima Publicado em12:42 - 23 de novembro de 2022

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